segunda-feira, novembro 19, 2007

Ser

És livre.
Podes voar,
Estar onde quiseres quando bem te convires.
Vês tudo que queres.
De tudo sabes.
Ouves pensamentos 
como se fossem ditos a ti em alto e bom tom.
Mas não vives como eu.
Não conheces o prazer de se esquentar ao sentir frio.
Não entendes o sabor ínsipido da água.
Não riste uma boa gargalhada.
Nunca sentiste a chuva ensopar-te
Não, jamais compreenderás os prazeres do ser.
Fica com tua liberdade do não-ser.
Renuncio a ela.
Fico presa ao chão, tu dizes.
Pois fico.
E a cada rosto, conhecido ou não
Reconheço-me, pois são como eu.
Limitados, dizes.
Mal sabes que vivemos em cada um,
basta querermos.
Basta querermos para sermos cada um que passa em nosso caminho.
Infinitas possibilidades.
E nessa unicidade múltipla, experimento a uma só vez
todos os prazeres do ser e a liberdade do não ser
sem deixar de ser.
Mas ao contrário, sendo ainda mais,
pois torno-me completa agora.

Isabelle.
19/11/07

Salto

Enquanto caio, sinto não a minha queda,
mas a queda de todos do mundo.
E é impossível não amá-los.
tão pequenos e solitários
tão frágeis.
Como eu.
Frágeis e inseguros.
Têm medo da queda.
Têm medo de saltar.
Mas esquecem-se que apenas saltando alcançarão o mais alto.
esquecem-se que apenas com a queda alcançarão o alívio
de estar de volta ao chão.

Não sinto mais medo da queda.
pois na queda, encontro o chão.
e no chão, apoio para um novo salto.
E se dobrar bem os joelhos,
se conseguir bastante impulso,
talvez consiga chegar ainda mais alto.
E ver ainda mais longe.
E no instante segunte,
cair.
E na queda, sentir a queda de todos do mundo mais uma vez.
Sinto suas dores, em mim.
E é por isso que não esqueço de dobrar os joelhos ao cair.
Pois o mesmo chão que me alivia de minha queda,
fere-me se eu deixar.
E não posso deixar, pois em minha queda há a dor de todos do mundo.
e seus anseios,
e seus desejos.

Venha comigo.
Dobre os joelhos, para um bom impulso.
salte.
Estique-se, para chegar mais alto.
E sinta a vertigem de cair.
Sinta-se parte de cada um do mundo
mas não se distraia.
Não se esqueça do chão.
ele aproxima-se mais e mais
antes que você espere.
Não se esqueça de dobrar os joelhos novamente.
Como uma reverência,
como fez para deixá-lo, você faz novamente para reencontrá-lo.
E livrar-se da vertigem embriagante da queda.

Isabelle
18/11/07

segunda-feira, outubro 08, 2007

Não sei quantas almas tenho

Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não tem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que sogue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo : "Fui eu ?"
Deus sabe, porque o escreveu.

Fernando Pessoa

sábado, julho 28, 2007

Cinco anos depois, aquela febre de lirismo que assola todos adolescentes em algum momento, a atingiu.
E a menina esqueceu sua promessa. Escreveu mais um poema.
Teve a impressão de que o poema rangia se fosse lido muitas vezes. Como tudo que permanece sem uso durante muito tempo. E tinha certeza que não era sua imaginação. Não importava quantas vezes o passasse a limpo, nada tirava dele aquele ar meio empoeirado, meio embolorado.
Percebeu que sua escrita estava a o mesmo tempo com a ferrugem natural do que é antigo e a aspereza das coisas novas que ainda não foram polidas.
Mas gostou mesmo assim. Tinha algo de agradável na repetição quase infantil do mesmo verso. Na escolha meio óbvia do título. No tema já tão saturado, mas ao mesmo tempo tão inesgotável. As estrofes, em quartetos, davam um ar de cantiga ao poeminha. Sim, não restava dúvidas. Apesar de sua simplicidade havia algo de simpático nele.
Tal qual a coruja, que acreditava serem seus filhotes os mais belos do mundo; ela também, tomada, de surpresa, por um amor àqueles frágeis versinhos, sentiu-se orgulhosa.
E então, cometeu o erro fatal. Mostrou-o a mais alguém. Que fique registrado, que a pessoa a quem foi mostrado a pequeno poema também estava então tomada pela febre de lirismo. Achou-o também agradável, bonito até. Veio então o parecer. "Bonito. De onde você tirou?"
Ela sabia que devia-se sentir orgulhosa. Aquela pessoa achara seu poema digno de figurar entre aquelas dignas poesias presentes em coletânes e antologias. Mas não sentiu nada disso. Sentiu apenas a face enrubrescer. Não entendeu o sentimento que a tomou. Não era vergonha. Seria raiva? Não.
Apenas sentiu-se de volta àquela segunda semana de abril, há cinco anos atrás.

terça-feira, julho 17, 2007

Voltamos no tempo. Para um momento na segunda semana de abril, há 9 anos atrás.
A tarefa era simples. Escreva uma redaçãosobre o descobrimento do Brasil. Quinze linhas. Fácil. Ela nunca tivera dificuldades para escrever textos. Não uma, mas ao menos três idéias originais brotaram em sua mente no momento. Sugeriu duas delas às amigas. E guardou para si a que mais lhe agradava. (Sabe como é, mesmo aos 9 anos de idade, não era imune ao egoísmo)
Ainda na escola, na hora do recreio, sentou-se para escrever.
Do ponto de vista da caravela. Um poeminha. Simples. Mas agradável.
Dois dias depois, a hora da verdade. Só esperava um sorriso da professora quando esta lhe entregasse a nota. Nada mais.
Não só não obteve o sorriso como também ouviu algo inesperado.
O poema já existia! Datava da infância de sua professora. Ela não entendeu do que estava sendo acusada. Não tinha como imaginar. Mas estava sendo acusada de plágio.
Duas frases depois, duas insinuações depois, percebeu, entendeu.
Sem compreender como isso era possível, baixou os olhos para a carteira.
Uma lágrima escorreu por seu rosto e caiu na mesa verde-água. Duas agora.
A professora viu as lágrimas. Interpretou-as como arrependimento.
A amiga ao lado, como vergonha. O amigo ao outro lado, raiva perante a injustiça.
Mas apenas ela sabia que enquanto essas duas lágrimas escorriam, uma promesssa estava sendo feita.
Jamais escreveria um poema novamente. Jamais passaria por aquele momento novamente. Jamais daria razão para ser tão injustamente acusada. Ou tão duramente criticada.
Passou os 5 anos que se seguiram sem escrever um poema sequer.
Passou os 5 anos que se seguiram sem escrever uma linha que não fosse absolutamente necessária.
Mal sabia ela, isso não impediria as acusações injustas. Nem as críticas.

sábado, julho 14, 2007

Autopsicografia

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

Fernando Pessoa

terça-feira, julho 03, 2007

Sempre que tiver a impressão de auto-conhecimento, desconfie.
É balela.

segunda-feira, abril 02, 2007

Saudades e razões



Nem sempre entendemos as razões.
Muitas vezes nos parece absurdo e ilógico.
Mas nem sempre nos cabe entender. Devemos compreender e aceitar. Por mais difícil que pareça.
Carlinhos desencarnou. Não entendo porque. Não me parece lógico. Não quero aceitar.
Mas não posso mudar esse fato.
Sei que a vida tem que continuar. Sei que ele também sente saudades. Mas o nosso amor o encoraja a seguir em frente. Aprendendo, crescendo e trabalhando no bem. Assim como o seu amor nos encoraja. Encoraja a acreditar que a vida continua. Nos encoraja a viver apesar da saudade.
Sei que Carlinhos continua conosco. Mas embora possamos sentir sua presença, não podemos mais brincar e fazer piadas com ele. E isso fere o coração.
Mas sei também que essa separação não é eterna nem definitiva. Daqui a algum tempo estaremos juntos novamente, brincando, aprendendo, trabalhando juntos.
E tampouco aconteceu sem motivos. Nem sempre conseguimos entender o porquê. Mas nunca devemos acreditar que ele existe.

Tenho um pedido a fazer para vocês. Por favor, rezem pelo Carlinhos. E pela família dele. É um momento difícil. Muito difícil. E nossas orações com certeza ajudarão Carlinhos nesse momento de transição. E ajudará sua família nesse momento de desolação.

Carlos Henrique Silva Boechat. Esse foi o nome de Carlinhos. Um menino de 12 anos. Mas um espírito imortal. De milhares de anos. Cuja missão dessa vez foi curta.
Carlinhos... Um dia nos encontraremos novamente...

sábado, março 31, 2007

Digressão - ou Sobre os Meus Erros



"O que realmente importa não é quantas vezes nos vemos, mas quantas vezes pensamos uns nos outros." (K.H. II)

Dizem que sumo. Que desapareço. Sou relapsa.
É bem possível que eu mereça mesmo todas essas acusações.
Mas que posso fazer? Sei que esse meu jeito de ser machuca aqueles que são mais próximos. Justamente os que mais se preocupam em não me machucar.
Acreditem, não faço por mal. Ao mesmo tempo que passo meses sem procurar aqueles que mais amo, não consigo passar um dia sem pensar neles.
Não posso prometer que mudarei e não farei mais isso. Mudanças não são tão simples assim. E não farei promessas sem saber que posso cumpri-las.
Assi, termino esse post meio sem propósito. Com a impressão de que ele terminou antes de começar.
E ele fica sendo então apenas isso.
Não uma justificativa, nem uma promessa de mudança.
Apenas um pedido de desculpas.

terça-feira, março 13, 2007

Angels Without Wings



Há muito tempo atrás - milênios, talvez eras - , num mundo diferente desse que conhecemos, duas amigas escreveram num caderno três palavras.
Naquele momento não sabiam que aquelas três palavras ficariam para sempre em seus corações.
Angels Without Wings.
Era assim que se sentiam. Anjos. Seres feitos para a imensidão. Mas sem asas. E, portanto, presos ao chão.
O tempo passou, o mundo mudou, elas mudaram. Mas as três palavras continuam marcadas em seus corações.
E agora, com o mundo mudado e o tempo passado, perguntam-se porque, naquele dia tiraram despreocupadamente as asas dos anjos.
Pois o que mais almejam nesse momento são asas. Para vencer a distância gigantesca que aparentemente as separa.